No último dia 4 de março, morreu aos 90 anos de idade, o Professor Thomaz Starzl. Este homem foi o primeiro a realizar um transplante de fígado, em 1963. Considerado o “pai dos transplantes”, Starzl contribuiu com a medicina de forma a falarmos em medicina antes e depois dele!
Na verdade, eu poderia, como transplantador, escrever páginas e páginas sobre suas obras e feitos médicos, ou mesmo sobre sua coragem em estabelecer como rotineiras, cirurgias que, até que ele as realizassem, eram consideradas impossíveis.
Apenas para termos uma noção, atualmente, em consequência de sua iniciativa em 1963 ao realizar o primeiro transplante hepático, são realizados mais de 15.000 destes transplantes anualmente, no mundo.
Apenas fazendo uma simples conta, no dia da sua morte, ele deve ter sido lembrado através de mais de 40 destes procedimentos realizados em todos os cinco continentes. Todavia, ao invés de repetir o que várias publicações na imprensa internacional destacaram por ocasião da sua morte, eu gostaria de destacar seu último feito: sua morte.
Apesar de não conhecer os detalhes de como ela ocorreu, vi declarações de sua família de que o Professor “Thomaz Starzl morreu em paz, na sua residência em Pittsburgh”. Talvez estejam estranhando a minha maneira de enxergar o que houve, mas gostaria de ponderar com vocês o que me parece a consagração de um homem com inteligência e capacidade de raciocínio extraordinários.
Tenho a certeza de que o Professor Thomaz Starzl poderia estar internado em qualquer UTI, de qualquer hospital dos EUA, sendo rodeado pelos mais competentes médicos do mundo, talvez entubado e respirando pelo mais moderno aparelho de respiração artificial. Mas não! Estava “em paz e em casa”.
O “Homem Starzl”, que enxergou a possibilidade de fazer o impossível durante a sua vida, pela vida dos outros, deve ter reconhecido o mais importante: a terminalidade, como fator intransigível do ser humano. Deve ter sido suficientemente lógico e racional para optar estar com a família em sua casa, no momento da sua despedida.
Transcrevo aqui um parágrafo escrito pela família, na ocasião da morte, destacando suas qualidades: “Thomas Starzl é um pioneiro, mundialmente reconhecido em ciência e medicina, mas além desse manto ele era simplesmente conhecido e amado pela pessoa que ele era. Ele era marido e alma gêmea de Joy Starzl, pai de Tim Starzl (Bimla), Thomas F. Starzl e Rebecca Starzl, avô de Ravi Starzl (Natalie) e padrinho de Lamont Chatman e Angela Ford. Ele era profundamente amado por sua tremenda inteligência, humor e sensibilidade. Seus traços de humildade, observação afiada e memória aparentemente ilimitada fundiram-se para criar uma personalidade única que era ao mesmo tempo inspiradora e reconfortante. Sua vontade de permanecer sempre em movimento o levou a grandes aventuras ao redor do mundo, desde seus amados Colorado Rockies ao mar do Japão, da tundra do norte da Finlândia às praias de Mônaco. Ele tinha um amplo conhecimento e apreciação por toda a música, do clássico ao jazz moderno. Ele gostava de assistir e analisar filmes, muitas vezes pesquisando sua produção e tópico por horas, antes e depois de repetidas exibições. Ele criou e cuidou de muitos companheiros caninos, incluindo Bevo, Thor, Maggie, Tiki, Shelby, Basta, Chooloo e Ophelia. Seu amor incondicional era igualado apenas por seu próprio amor por eles. Ele fará muita falta”.
Que tal usarmos o exemplo do Professor Thomaz Starzl e, além de trabalhar pelo bem da humanidade, aprendermos a reconhecer nossas limitações e a morte como algo natural?
Thomaz Starzl – Uma lenda do princípio ao fim.
FONTE: Veja.com.br